segunda-feira, 6 de abril de 2015

Sobre o seu nome

Postado por Mãe do André às 22:01
Meu filho,

Acho que hoje, finalmente, eu e seu pai decidimos o seu nome. Nossa, não foi fácil. Se você fosse uma menina, talvez tivesse ficado sem nome por menos tempo. Talvez. Para meninas, tínhamos ao menos uma pequena lista de possibilidades. Mas para meninos, o desafio pareceu ser maior. Não pense, com isso, que preferíamos que você não fosse um meninão. A questão nem de longe foi essa! Mas foi uma tarefa tão difícil que eu resolvi registrar nossa pequena odisseia.


Seu pai foi quem primeiro se preocupou com o fato de você estar sem nome. Eu confesso que entre sono, enjoo, cérebro “avoado” e trabalho de fim de ano, essa decisão não estava no topo da minha lista de prioridades. Tínhamos tempo. Seu pai perguntava, implicava e, às vezes, até insistia: ele queria conversar com você chamando-o pelo nome. Até o ultrassom que confirmou seu sexo, a ansiedade do seu pai era fácil de ser contornada. Nem o livro de nomes de bebês que ele trouxe para casa me intimidou. Na verdade, o fato de você não ter sequer uma lista de possibilidades me incomodava também. Mas é que, para mim, parecia uma responsabilidade tão grande... É o seu nome! Algo que você vai levar para o resto da sua vida, parte da sua identidade. Eu não queria apenas uma palavra bonita que o identificasse.

E opções bonitas não faltavam. Eu e seu pai pensamos em vários nomes que achávamos bonitos. Mas, sei lá, nenhum era o nome do nosso filho. Nenhum era o seu. Um dia, seu pai quis abrir oficialmente sua lista de possibilidades com um desses nomes: Lucas. Aceitei. Não tinha convicção, mas foi o primeiro consenso. Pelo menos você começava a ter possibilidades. Sua “lista” de um nome só permaneceu assim por alguns dias – semanas talvez. Até que, uma noite, quando o seu pai já estava mais dormindo do que acordado, eu me lembrei de algumas coisas. E cutuquei seu pai no quarto escuro:

- Lindo, não tenho certeza de nada, mas posso colocar mais um nome na lista?

- Qual? – perguntou seu pai mais resmungando do que falando de tão sonolento.

- André.

Seu pai fez alguns segundos de silêncio (e eu cheguei a achar que ele tinha voltado a dormir) e falou mais animado:

- Pode ser. Eu gosto de André.

E fomos dormir sem continuar o assunto.

Hoje, filho, quero contar a você o que eu lembrei naquela noite e que fez esse nome, que nunca havia chamado minha atenção antes, se tornar o seu nome.

Você era querido e esperado há muitos anos, mas eu decidi que de 2014 não passaria. Se dependesse apenas da vontade minha e do seu pai, teria sido ainda antes – bem antes – mas não deu. E essa frustração acumulada de meses de adiamento indesejável fez com que você estivesse em meu pensamento quase que constantemente em 2014. Mas eu me lembro que foi no Emees (encontro de jovens que eu e seu pai ajudamos a organizar desde 2001) que eu me peguei conversando com você pela primeira vez.

Eu me perguntava se você já estaria por aqui, se estaria no encontro, se seria espírita e se aquele ambiente, um dia, seria tão importante para você quanto é para mim e para o seu pai. Em alguns momentos, no auditório, eu me emocionei pensando em você e, num ato quase involuntário e instintivo, levei à mão à barriga, como se você já estivesse ali. Lembro de dizer: “está vendo, filho? É nessa filosofia que eu e seu pai queremos criar você. Com esses valores. Queremos muito que você possa sentir toda essa energia boa para ter forças de seguir no caminho do bem mesmo quando o mundo nos empurra para a direção contrária”.

Acho que, de alguma forma, seu pai também sentiu essa conexão, pois quando o grupo de crianças entrou no palco, ele me disse com um sorriso bobo:

- Será que no ano que vem a gente vai estar lá em cima com nosso filhinho?

Sorrindo, e até um pouco emocionada, respondi:

- Eu estava aqui pensando exatamente a mesma coisa!!!

Após o evento, as frustrações continuaram e sua vinda precisou ser adiada mais uma ou duas vezes. Mas você, de alguma forma, já fazia parte da minha rotina. Eu conversava com você em voz alta algumas vezes, pensava em você o tempo todo e cheguei a escrever uma carta a você – a primeira! – pedindo desculpas pela demora. Lembra?

Então, no meio do ano, recebi uma tarefa com um misto de alegria e pânico: participar da criação de um livro que registrasse o encontro que passou. Seria responsável por escrever um conto de ficção, que usasse histórias reais de jovens que fizeram/fazem a diferença no mundo como pano de fundo. Escrever um livro é um sonho antigo. E escrever um capítulo era menos assustador. Eu acredito que em um trabalho como esse a gente não faz nada sozinho. A inspiração veio aos poucos. Na primeira reunião para discutir as primeiras ideias, eu ainda não tinha nenhuma, mas ouvindo as outras propostas comecei a formar algum esboço. Alguém deu a sugestão do conto acabar na maternidade e, a partir daí, não conseguia mais descolar a história de você. Nessa época, você já era um projeto real e as tentativas haviam, oficialmente, começado.

Vamos deixar algumas coisas bem claras, filho: você não é o personagem do conto e eu não espero que você tenha o peso de uma missão extraordinária. E mais importante: quero que você viva muitos e muitos anos na Terra (o planejamento curto do personagem era uma exigência da linha editorial do livro). Mas eu não podia não pensar em você enquanto escrevia: o que se passa na cabeça de alguém que está prestes a renascer? Será que você estava mesmo no Emees? Será que você não estaria com medo ou ansioso? Afinal, esse mundo não é, assim, um mar de rosas. É assustador mesmo. Ao pensar no processo de reencarnação, não tive como não me emocionar. Podia não ser exatamente daquele jeito, mas era algo pelo qual você estaria passando em breve – essa, pelo menos, era a minha esperança que, graças a Deus, se confirmou. E eu me pergunto se você sentiu comigo essas emoções. Se realmente participou dos nossos bate-papos, se realmente estava lá.

Mas meu personagem não se chama André por causa de você. Na verdade, até aqui eu tive dificuldades de pensar em nomes. Queria deixar registrado um sentimento e, por isso, escrevi todo o conto usando “Fulano, Beltrano e Sicrano”. E meus personagens permaneceram sem nome até os 45 minutos do segundo tempo, quando faltavam 10 minutos para estourar meu quarto ou quinto prazo final. Como a ideia era integrar os capítulos, eu saí lendo os outros contos e fui pegando “aleatoriamente” (porque não acredito no acaso) nome de outros personagens que poderiam ser os meus. E, assim, saiu André. Um nome que jamais imaginei na minha vida, que eu não acho particularmente mais bonito do que tantos outros por aí, mas que virou o símbolo do meu sentimento por você e por essa gestação. Um símbolo de todas as “nossas conversas” e de todas as vezes que pensei em você no ano que passou.


Foi difícil, filho. Eu ainda acho uma responsabilidade enorme dizer ao mundo como chamar você. Mas nenhum nome consegue competir com o que o André representa. Por isso, ainda que receosa e sem muita convicção (confesso), acho que já posso dizer: bem-vindo à Terra, André!

Vitória, 04 de janeiro de 2015

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4 comentários no blog:

Thiago Valadares disse...

Renata, que texto lindo! Quanto sentimento. Eu ia lendo e parece que ouvia você, como se estivesse me contando. Parabéns! Beijos

Thiago Valadares disse...

Não "me" contando, né? Mas acho qur vc entendeu, kkkkk. Beijos

Anônimo disse...

Muito bom o texto! Estou exatamente nessa fase de decidir o nome, soubemos essa semana que estamos esperando um menino ! Até soube o nome que ele teve antes, mas não quero repetir... afinal, trata-se de uma nova experiência ! Abraços!

Mãe do André disse...

Fico muito feliz que você tenha gostado e até se identificado com meu texto. Pena que não assinou! Gostaria de saber quem você é! De qualquer forma, seja muito bem-vindo ao blog! :)

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