sábado, 7 de novembro de 2015

Ainda sobre nossa jornada com a amamentação

Postado por Mãe do André às 21:00
Bom dia, meu filho. Na última carta eu escrevi sobre os seus primeiros quatro dias de vida e como eles foram intensos no que diz respeito ao nosso aprendizado sobre a amamentação. Sim, todas as aquelas páginas contam a história de apenas 4 dias. Nossa jornada estava apenas começando e muita água ainda iria rolar por baixo dessa ponte. E é isso que eu quero contar para você agora.


Bem, após a “noite do terror”, as mamadas seguintes foram bem mais tranquilas. E os dias também. Seu pai conseguiu emendar a licença paternidade com o feriadão de Corpus Christi e continuava nos ajudando nas mamadas. Amamentar ainda era um momento de tensão e exigia muita concentração e observação do seu corpinho, mas pelo menos já dava certo. Na quinta-feira, começamos nosso “voo solo”, isto é, seu pai nos deixava no quarto sozinhos e ia lá de vez em quando ver se precisávamos de ajuda (afinal, ele voltaria a trabalhar na segunda-feira). Continuamos indo ao banco de leite todos os dias naquela semana. Chegávamos lá cheios de dúvidas e sempre aprendíamos alguma coisa nova. As enfermeiras sempre conseguiam nos acalmar e dar dicas valiosas – mesmo que, às vezes, dessem conselhos conflitantes. Nem sempre seu pai podia entrar comigo, pois duas ou três mulheres eram atendidas ao mesmo tempo (era tão triste para mim) e eu confesso que ficava sempre tensa de atravessar com você tão pequenininho e frágil por uma recepção de hospital lotada de gente doente e tossindo para todo lado.

Mas a gente começou a ver os resultados. Seu pai me ajudava cada vez menos e seus choros de gases diminuíram bastante. Mas foi só na quinta-feira seguinte, dia 11 de junho, após a sua primeira visita à pediatra é que eu realmente relaxei! Você não só tinha recuperado o peso da maternidade como havia engordado mais 110 gramas! Que alívio! Tinha dado certo!!! Foi só ali que eu comecei realmente a curtir a amamentação, que dar o peito para você perdeu o “peso”. Eu me senti mais relaxada e confiante em tudo o que eu aprendi com as enfermeiras. Algo como “a gente conseguiu”, “eu posso”, “já deu certo”, “o pior já passou”. Passei a me sentir mais segura como mãe e até passei a ter vontade de ficar sozinha com você para ver como me sairia (na semana em que seu pai voltou a trabalhar eu fiz até uma planilha no computador pedindo a avós, tias e amigas para preencher cada pedacinho livre, achava impossível ficar 5 minutos sozinha com você! rs). Vou tentar resumir alguns desses aprendizados tão importantes para nós:

* MASSAGEM E ORDENHA
Não tinha jeito, filho. TODA VEZ que você ia mamar, a mamãe precisava preparar o seio. Fazer uma massagem caprichada e tirar um pouco de leite até que a mama ficasse mais macia. Era um saco, um trabalhão repetido até 10 vezes por dia. Mas não tinha jeito. Com o peito duro você não conseguia fazer a pega correta, não mamava bem e eu ainda corria o risco de me machucar. Então, era preciso vencer a preguiça e trabalhar o autocontrole para fazer isso enquanto você berrava de fome no colo de alguém. Hoje comemoro a vitória de, simplesmente, levantar a blusa e colocar você direto no peito. Eu chego a sorrir cada vez que faço isso em público porque sei o quanto demoramos para chegar até aqui. Mas por uns 40 dias era preciso fazer a massagem e a ordenha em TO-DAS as mamadas. Depois, mais naquelas da madrugada e da manhã. Você já tinha bem mais de 2 meses quando preparar o peito virou exceção. Mas o que mais doía era jogar todo aquele leite pelo ralo da pia. As enfermeiras eram enfáticas: mesmo com muito leite eu não poderia virar doadora enquanto você não aprendesse a pega correta, pois somente assim iríamos regularizar as mamadas e a produção de leite. Isso aconteceu 15 dias depois da nossa primeira ida ao banco de leite. Fiquei tão feliz! Doadora de leite! Olha que luxo! Mas isso significava incluir no processo de preparar o seio: lavar os braços e as mãos, colocar touca, lenço sobre a boca, tirar o leite para doar e esterilizar o copo utilizado depois. Ou seja, nem sempre dava e fora de casa era impossível. Então muito leite foi, literalmente, pelo ralo até tudo se normalizar.

* SORRISINHO DO TERROR
No primeiro mês, filho, você não sorria. Normal. Mas existe um reflexo muscular do bebê muito comum nessa fase que se parece muito com um sorriso. Um sorrisinho tímido, de canto de boca e, geralmente, só de um lado da boca: é o sorrisinho do terror! Ele é um aviso de que uma crise de cólica está a caminho. Era preciso caprichar nas tentativas de fazer você arrotar, mas geralmente só servia como aviso mesmo. Não me peça explicações científicas, só sei que funciona. Menos de cinco minutos separavam o sorrisinho dos gritos inconsoláveis de cólica. E com o tempo dava para saber direitinho a diferença dele para um sorriso de verdade.

* A (MAIS OU MENOS) LIVRE DEMANDA
Livre demanda é a expressão de ordem quando se fala em aleitamento materno, filho. Isso significa que o bebê mama a hora que quiser, quantas vezes quiser e pelo tempo que quiser. Essa é a teoria. Na prática, descobrimos que a demanda não é tão livre assim.

Nos primeiros 15 dias, então, as regras são muitas. E variadas. Nesse período, o bebê precisa recuperar de qualquer jeito o peso do nascimento e há um verdadeiro terrorismo em torno disso. A ameaça é o leite artificial, muitas vezes recomendado – e usado – como prevenção(??) do problema. Falam muito do perigo do bebê ter hipoglicemia e garantem que se ele dormir muito nesta fase não é um motivo de comemoração porque está saciado. Não, dormir muitas horas seria um risco(!) porque significa que a taxa de açúcar no sangue do bebê está baixa. Então, a primeira ordem é acordar o bebê a cada 2 horas durante o dia e a cada 3 horas durante a noite e enfiar leite goela abaixo. Conheço muitos pais que se arrependem até hoje de terem feito isso porque seus filhos continuaram acordando a cada três horas depois. Mas com você não foi diferente, a não ser pelo fato de você acordar quase sempre sozinho dentro desde período, fazendo nossa vida ficar mais fácil (não era preciso decidir entre acordar ou não). Depois que você recuperou o peso, passou a dormir mais e a gente deixava - só acordávamos você de dia e mais para evitar que você trocasse o dia pela noite do que pela preocupação com o "estômago vazio".

Outra questão de tensão entre as recém-mamães é o tempo da mamada. A demanda é livre, DESDE QUE o bebê mame, no mínimo, 15 a 20 minutos. Isso porque o leite posterior, ou seja, o que desce depois de algum tempo de mamada é o que engorda o bebê, o que o faz ganhar peso. O primeiro leite mata a sede e tem muitos nutrientes, mas o bebê só engorda com o leite posterior. E não é só isso, filho. Além do tempo mínimo, também me orientaram a não deixar você mamar mais de 40 minutos nesses primeiros dias porque seu estômago era muito pequeno e você poderia vomitar (e na única vez que desobedeci essa orientação, isso realmente aconteceu!). E como bebês pequenos costumam ter refluxo, é bom dar um intervalo de, pelo menos, uma hora entre uma mamada e outra. E esses tempos todos vão variar um pouco de um profissional para o outro, ou seja, cada um vai falar uma coisa e a mãe vai ficar completamente perdida sem saber o que fazer!!!

Resumindo: o bebê deve mamar exclusivamente no peito e em livre demanda, com o tempo e a frequência que ele quiser, DESDE QUE ele ganhe peso rápido, que mame no mínimo de 15 a 20 minutos na maioria das mamadas, no máximo 40 minutos e desde que os intervalos não sejam maiores que 2 ou 3 horas nem menores do que 1 hora!!! Ahhhhhhhhh!!!! É ou não é de enlouquecer qualquer um? Mas agora que tudo passou, a demanda é livre de verdade. Graças a Deus essa confusão acabou!

* A BODADA DOS 10 MINUTOS
Seguindo a lógica de um tempo mínimo de mamada, aprendemos que nem sempre quando você parecia estar saciado você realmente estava. As enfermeiras do banco de leite explicaram que mamar é muito cansativo para um bebê, principalmente nos primeiros dias. E, às vezes, o cansaço é tanto que eles dormem no meio da mamada. Sim, no meio. Assim que o bebê descansar um pouquinho ele vai perceber que ainda está com fome e querer mamar, o que vai se transformar em mamadas de hora em hora ou menos (muito menos!). E com você não foi diferente, filho. Era preciso acordar você! Mexer na bochecha, nas costas, no pé, tirar a roupinha, qualquer coisa. Quando você dormia mesmo, era preciso tirá-lo do meu colo, levantá-lo e mexer nas suas costas. E você chorava! Uma dó!! E você já era o meu reloginho britânico. Com 10 minutos de mamada, desmaiava e nada parecia fazer você acordar. Era impressionante. Toda mamada, sempre por volta dos 10 minutos. Então seu pai pegava você no colo pelas axilas e mexia ao mesmo tempo nas costas. Nesta posição desconfortável você acordava e chorava. E mamava por mais 5, 10 ou mesmo 15 minutos. Então já sabíamos: não podíamos acreditar na bodada dos 10 minutos.

* SE DÓI, ESTÁ ERRADO!
Para a maioria das pessoas, amamentar é sinônimo de dor. É quase um consenso, o senso comum. Essa é a pergunta que eu mais ouço, filho: “Dói?” Não. Pelo menos não é para doer. As enfermeiras me explicaram que a dor é sinal de que a pega está errada. Então, é preciso retirar o bebê imediatamente do peito e começar tudo de novo. Suportar a dor (como muitas mulheres acreditam que devem fazer) vai machucar o bico do seio e, aí sim, amamentar vai ser muito dolorido. Claro que à medida que você cresce, filho, abocanha com mais força e mama com mais vigor. Às vezes a pressão é forte e, no início, o bico fica, sim, dolorido. Mas não é exatamente dor, é mais um desconforto.

Felizmente descobri isso antes que você me machucasse e não tivemos qualquer do tipo de problema no primeiro mês. Infelizmente, mesmo assim acabei passando pela experiência de amamentar com dor. No seu segundo mês de vida, suas cólicas aumentaram muito e você passou a ter refluxo, ficando muitas vezes irritado no peito. Em uma dessas vezes, você parou de sugar, começou a chorar com a boca ainda no meu seio e... ME MORDEU! Jamais imaginei que uma boca sem dentes pudesse fazer tanto estrago! E o pior: isso se repetiu algumas vezes!! Resultado: meu bico feriu. Teve uma vez que ele até soltou um pedacinho. Por alguns dias (que hoje parecem poucos, mas que naquela época pareciam eternos) eu amamentei com dor. Muita dor. Chegava a chorar. Às vezes começava a chorar antes mesmo de colocar você no peito, só por não acreditar que já estava na hora de mamar de novo. Passava o leite, tomei um pouco de sol e também coloquei a lâmpada. Aliviava, mas não resolvia. Encontrei uma pomada na farmácia e vi a luz no fim do túnel. No início, doía apenas quando você abocanhava, mas começou a não doer mais durante a mamada. Depois de dois ou três dias, o alívio! Tudo passou! Tudo! Chorei mais uma vez na primeira mamada sem dor depois de tantos dias (três dias parecem pouco, mas lembre que significam até 30 mamadas com dor!). Até hoje a pomada anda comigo, na sua bolsa de fraldas. Uma mordida ou sugada mais forte que você dá já é motivo para eu lambuzar o seio com ela. Coincidência ou não, nunca mais tivemos problemas! A dica eu sigo até hoje: começou a doer, tiro você do peito, arrumo sua posição e coloco de novo. Para de doer na mesma hora! É incrível!


* DICAS DE OURO DA VOVÓ
Alguns conselhos que recebi no banco de leite pareciam bobeiras, detalhes mínimos, quase crendice de vó, mas fizeram (e ainda fazem) uma diferença enorme no nosso dia a dia. Na outra carta eu citei o simples ato de enxugar meu seio e sua boquinha de tempos em tempos, para você não escorregar. Uma dica de ouro que nos acompanha até hoje. O simples ato de tirar sua meinha do pé também ajuda, faz você ficar mais desperto. Outra dica simples: puxar sua roupinha, para evitar que ela se embole no seu pescoço. Parece bobeira, mas como você era muito magrinho, a roupa acumulada se transformava em obstáculo para você movimentar o queixo de maneira correta, o que é essencial para uma mamada eficiente. Quando percebia que sua boca parava de fazer o movimento completo e que você estava só “chupetando”, fazendo apenas o movimento de abrir e fechar a boca, em forma de mordida, bastava puxar sua roupinha para baixo para você voltar a mamar corretamente. O mesmo valia para a minha mão: como meus seios são grandes, era interessante eu sustentá-los para você, mas se minha mão ficasse muito perto da sua boquinha acaba impedindo sua mamada correta. Pequenos detalhes, grandes diferenças.

* NADA DE COMPRESSAS
Muita gente recomenda fazer compressas no seio que está muito cheio de leite. Há quem diga que o melhor é compressa fria. Outros dizem que o melhor é compressa quente. Sabe qual é a melhor? NENHUMA! Isso era uma recomendação comum há algum tempo, filho, mas hoje é consenso e as enfermeiras são enfáticas: as compressas só vão piorar a situação de um seio dolorido de leite. Se for fria, os vasinhos vão se contrair, dificultando ainda mais a saída do leite acumulado. Se for quente, vai estimular mais a produção de leite, agravando a situação. Então a melhor solução é massagem, ordenha e a sua sucção, filho. Você mamar é a forma mais eficiente de esvaziar o peito e aliviar o desconforto. O problema era na hora do banho, chegava a ser engraçado. Como era inverno, eu queria banho quente e tinha que entrar no chuveiro "de bumbum", com os ombros dobrados para baixo para evitar ao máximo que a água encostasse no seio. A sensação era que não estava me limpando direito, rs.  Mas isso também já passou! :)

*APOIO É FUNDAMENTAL
Filho, é fato: ninguém amamenta sozinho. Simples assim. Eu sei, só a mãe tem seio e ninguém pode substitui-la nesta função, mas para amamentar não basta um seio cheio de leite e vontade, filho. É preciso apoio. Muito apoio. Graças a Deus eu tive as enfermeiras do banco de leite e a sua pediatra, que é defensora da amamentação (e que não fazia qualquer pressão sobre seu ganho de peso, ao contrário, sempre insistia que já passamos da época em que bebê saudável era bebê gordo). Mesmo assim, não foi fácil. É uma fase em que a mamãe está frágil, filho, física e emocionalmente. É uma pressão enorme ser a única responsável pela nutrição do próprio filho. Dá medo de não conseguir e você entra numas paranoias irracionais (eu já achei que não tinha leite suficiente mesmo pingando leite do meu peito). Sabe, eu descobri que o assunto amamentação é muito traumático para a maioria das mulheres e me ver amamentando traz de volta para elas todas as dores, dúvidas e frustrações do passado. Às vezes, parecia que eu não podia nem tocar no assunto com outras mulheres, sempre ouvia histórias de terror ou recomendações que tinham força de lei: "você TEM QUE fazer assim porque foi assim que deu certo comigo". Oi? Suas avós tiveram experiências bem diferentes em relação a isso. Uma amou amamentar, chegou até a doar leite para amigas e acredita que com calma e paciência tudo se resolve. A outra não conseguiu amamentar nenhum filho e é só tocar no assunto para ver o quanto ela fica tensa: os ombros se elevam, o pescoço se contrai, a respiração muda!!!! Para ela, todo o estresse dessa fase inicial não vale a pena e nenhuma mulher deveria se sujeitar a tamanho sacrifício. Sinceramente, não sei nem se ela percebe que reage assim. Então, mesmo você estando na fase das cólicas, mesmo com um diagnóstico de refluxo, qualquer sinal de choro seu vinha acompanhado de: "esse menino está com fome!" E quando eu tentava argumentar, dizendo que você tinha a-ca-ba-do de mamar, e muito, a resposta era: "ah, essa mamada não deu certo, não!" Eu até hoje não sei muito bem como reagir a isso.

Hoje está claro que ela não falava da gente, filho. Estava falando dela mesma. Estava revivendo sua própria experiência. E sua avó é só um exemplo mais próximo. Até uma completa desconhecida já me abordou na rua ao primeiro som do seu choro e sentenciou: "esse bebê está com fome, você não vai dar mamar para ele, não?" Como eu disse, hoje (HOJE!!) eu sei que elas não estavam falando da nossa realidade. Mas quando você está insegura, fragilizada e cheia de hormônios, comentários desse tipo parecem questionar sua capacidade de mamífero, parece que elas estão dizendo que você não é capaz de ser boa mãe. E eu acabava me perguntando se realmente estava falhando em ler seus sinais e se você realmente estava com fome. É aí que entra a importância do apoio. E é aí que seu pai foi fundamental, filho! Além de toda a ajuda prática que ele nos deus (levar ao banco de leite, ler sobre o assunto, defender a amamentação exclusiva e sentar ao meu lado ajudando a posicionar você em todas as mamadas por três dias inteiros), o apoio psicológico e emocional que ele me deu foi fundamental. Toda vez que a insegurança batia, ele me mostrava como eu estava sendo irracional, me abraçava, me elogiava, mostrava tudo o que estava dando certo. E as vezes eu só precisava disso: um abraço, um aconchego, alguém me dizendo que vai dar certo no final. No auge no meu cansaço, eu às vezes nem queria comer, mesmo meu estômago estando roncando de fome. Seu pai sempre preparava algum lanche para mim e uma vez chegou a esquentar um prato de panqueca, sentar do lado da almofada de amamentação e me dar comida na boca! Às vezes faz isso com uma banana. E até hoje, de vez em quando, ele me dá água na boca. Nossa, e é uma sede que a gente sente!! Coisa de doido! Eu tenho duas garrafinhas de água filho, uma no meu quarto e outra no seu. No início, era preciso encher as duas várias vezes por dia (vááááarias). Pois vira e mexe, até hoje, quando eu vou encher alguma vejo que elas já estão cheias porque seu pai já fez isso. Parece um gesto simples, bobo, mas pra mim significa muito, filho. É o jeito dele dizer que ele está do nosso lado, de me apoiar na amamentação. Às vezes parecia que eu tinha ganhado meia hora a mais de sono só por não ter que encher aquelas garrafinhas, rs. Era um abraço, um gesto de carinho. Parecia só uma garrafa de água, mas para mim era um grande letreiro luminoso dizendo "você não está sozinha, eu estou aqui com vocês". Já disse e repito: se hoje você ainda mama exclusivamente no peito, filho, deve agradecer também ao seu pai.

------ x -------

Bem, boa parte desse aprendizado aconteceu na sua primeira semana de vida, filho. Foi intenso. Foram cinco visitas ao banco de leite em quatro dias. Quando você fez duas semanas, voltei lá para agradecer e tirar as últimas dúvidas. Foi quando virei doadora. Não é muito, mas fico toda boba por cada gota que consigo doar – o que fazemos até hoje! O resultado foi um ganho de peso maravilhoso. Em um mês, 1 quilo e 100 gramas!!! 

Passada essa fase inicial, muita coisa mudou (e várias vezes) e nem todas as orientações para esse período se mantiveram. Na semana que você fez dois meses, passou a mamar bem mais, 20 a 30 minutos no mínimo e em intervalos bem menores. Passamos a ter que usar os dois seios na mesma mamada pelo menos 1 ou 2 vezes por dia. Quando você fez três meses, tudo já mudou de novo. Cheguei a duvidar da minha capacidade de alimentar você quando percebi os seios murchos pela primeira vez. Você às vezes parecia regredir. No início de setembro, voltou a ter dificuldade em abocanhar o seio mais murcho e passou a precisar, de novo, que eu segurasse e sustentasse o seio para você (você já estava conseguindo mamar sozinho). Depois, não mamava mais do que 15 minutos seguidos. Passei a oferecer os dois seios em todas as mamadas – você passou a mamar mais, mas também a golfar mais. Seu refluxo piorou muito e às vezes eu tenho a sensação horrorosa de que meu leite só te faz mal! E a culpa? Será que foi alguma coisa que eu comi? Então mudamos tudo mais uma vez.

Sabe, filho, mamãe ficou meio paranoica, confesso, mas estou aprendendo que nessa vida de bebê tudo são fases. Passa. E percebi que preciso confiar no meu corpo. Percebi que tentando dormir a tarde quando você dorme, por exemplo, os seis enchem mais. Percebi que depois dessa sua fase gulosinha meu corpo passou a produzir mais leite. A natureza é sábia, se adequa. É difícil relaxar, filho. É tanto conselho desencontrado, tanto terrorismo sobre o quanto você deve engordar, que fica quase impossível não dar umas surtadinhas de vez em quando. Por isso, eu superentendo a mãe que opta pela mamadeira. Acho uma pena, mas entendo mesmo. Não estou falando daquelas que não puderam amamentar (essas eu tenho vontade de pegar no colo e abraçar bem forte por horas), estou falando das que acharam a mamadeira mais fácil e escolheram alimentar seus filhos assim. Porque, filho, em alguns (poucos) aspectos a mamadeira vai ser, sim, mais fácil (uma facilidade que não vale a pena, na minha opinião, mas que é real). Existem algumas coisas que ninguém conta sobre a amamentação. Deixa eu dividir você:

* Amamentar cansa
E não é aquele cansaço óbvio, filho. Nunca achei que ter um bebê seria moleza. Mas eu achava que o cansaço seria por causa da privação de sono, por dormir picado, por causa do fato de eu ter que estar lá, disponível e acordada, a cada 1h30 ou 2 horas. Não, filho, não é só isso. Não é só desse cansaço que eu estou falando. Eu fui abençoada, filho. Você dorme muito bem à noite. Sempre me deu intervalos de pelo menos 3 horas entre as mamadas e, já no segundo mês, dormia 5 a 6 horas seguidas, às vezes até mais. Assim, aquela exaustão causada pela privação de sono foi sumindo gradualmente. E foi aí que eu percebi que, mesmo quando eu conseguia a proeza de dormir 6 ou 7 horas seguidas (mesmo tempo que eu dormia antes de engravidar), em alguns momentos do dia eu me sentia completamente exausta, dormindo em pé, quase dopada de sono. Foi quando eu percebi que o tal cansaço louco era justamente após as mamadas e nos dias em que você fazia intervalos mais curtos entre elas. Percebi que o simples fato de PRODUZIR LEITE cansa! E muito!!! É exaustivo! Às vezes parecia que eu tinha tomado uma overdose de sedativos, era um sono descontrolado. Um pouco também de sabedoria da natureza, que sabe que eu preciso dormir para produzir mais leite. Então, não é apenas a privação de sono, filho. O simples ato de dar de mamar cansa!

* Amamentar é solitário
Sabe, filho, ainda bem que as coisas estão mudando no mundo e as pessoas têm se tornado mais sinceras em relação às dificuldades do pós-parto. Eu já tinha ouvido falar da solidão que muitas mães sentem no resguardo, estava um pouco preparada. Mas ninguém me falou o quanto amamentar pode ser solitário. No início, seu pai ajudava. Depois, quando voltou a trabalhar, eu passei a amamentar sozinha de madrugada. De dia, a hora da amamentação era a chance dele fazer algumas coisas: comer, tomar banho, cuidar da casa. E eu ficava lá, olhando para o teto, esperando a hora passar. Muitas vezes é uma delícia, filho. É, sim, um momento de troca de carinho e da gente se conectar. Mas a gente faz isso oito, dez, 12 vezes por dia!!!! Não dá para ser assim sempre. Muitas vezes parece que eu estou de castigo, que alguém me colocou no “cantinho do pensamento” e não me deixa sair. E pior, nem sei porque estou sendo punida, rs. E na casa dos seus avós, eu acabava ficando isolada em um canto da casa, perdendo o almoço, o papo, a festa. No início, isso era importante. Eu precisava prestar atenção no seu mamar e você precisava de tranquilidade para isso (até hoje você reclama se mamar em um local muito barulhento). Mas depois que a pega ficou automática, eu quase morria quando a visita consciente queria ir embora para eu “amamentar com tranquilidade”. Tinha vontade de gritar: “fica, pelo amor de Deus! Não me deixe aqui sozinha! Eu não fiz nada para ficar aqui de castigo!!!” #édramamaséverdade :D

Pois bem, esse problema eu resolvi consertar, principalmente quando você decidiu passar até mais de 1 hora pendurado no meu peito. Pago peitinho onde for, mas fico no meio da confusão para dar de mamar. E, em casa, a salvação se chama televisão. Fico vendo seriados, bobeirol e até filmes, o dia inteiro. Assim, você tem quanto peitinho quiser e precisar, sem pressa, sem impaciência da minha parte. Coloco o volume bem baixinho e, de preferência, vejo aqueles programas bem bobos que não exigem minha atenção total, assim também presto atenção em você. Só não ligo a TV quando você precisa de um cuidado mais intensivo (está com alguma dorzinha, por exemplo), na hora de dormir e nas raras mamadas de madrugada – nesses últimos dois casos é no seu quartinho e à meia-luz. Ainda me sinto sozinha de vez em quando, mas pelo menos agora a solidão é exceção e não mais a regra!

* Amamentar é exigente
Não importa se eu estou cansada, se tem tia e avó se estapeando para ficar com você, se fiquei doente, se não saio de casa há dois dias, se está um clima maravilhoso lá fora para pedalar. A cada 2 horas, no máximo, eu TENHO que estar lá e parar tudo o que eu estou fazendo para amamentar. Dane-se se eu estou com fome, se o chá está esfriando, se eu queria só mais cinco minutinhos. É hora de mamar e minhas vontades não interessam. Mas não é só isso. Não pode beber (para mim isso não é problema mas para muita gente é), não pode comer chocolate (dá gazes), não pode comer besteira. Você é crucificada se tomar refrigerante ou comer um chips. Industrializado nem pensar! Nem mesmo um biscoitinho integral ou de maisena. Tem cólica? Corta a farofa, o feijão, o brócolis. Cereal é quase um crime, olha a quantidade de açúcar dentro dele! É festa junina, mas passe longe da canjica e do pé-de-moleque! Agora, a suspeita é alergia, aí corta leite de vaca, queijo, leite condensado. CREEEEDOOOO!!! Não podia ser mais fácil, não?

E olha que nem posso reclamar, tem mãe por aí sem glúten, sem ovo, sem soja e sem comer um docinho há mais de um ano! Para quase tudo o que o bebê tiver, tem algo na alimentação da mãe para culpar. Tudo bem, tudo bem, eu faço se for melhorar! Mas o triste é que não há certezas, nem consensos. Ninguém sabe até que ponto a alimentação da mãe influencia. Consenso só há um: comer é bom e viver sob tantas restrições não é vida! E não dá para saber se você melhorou por causa da minha dieta ou por causa dos remédios. Às vezes tenho vontade de jogar tudo para o alto, comer o que eu quiser e deixar você chorar. Afinal, quem tem que lidar com o seu choro sou eu mesma e você não vai se lembrar, né? Maaaaaas... Foca no objetivo: o que são seis meses perto de uma vida inteira? Quem sabe isso não me ajuda a emagrecer? E eu quero /preciso tanto emagrecer. Quem sabe não é a desculpa perfeita para lidar com meu exagero de doces? O que são as dificuldades perto dos benefícios da amamentação? Respira fundo, segura na mão de Deus e segue com o peito de fora! :)

* Amamentar pode ser um pé no saco!!!! Mas é bom! Muito bom!!
Junte tudo o que falei até agora, todo o sufoco e as dificuldades do início da amamentação, todas as exigências físicas e mentais deste período e acrescente muitos hormônios. Bata tudo no liquidificador por seis meses de aleitamento exclusivo (se Deus quiser!) e ainda coloque nas duas primeiras semanas o aniversário de duas tias, um tio, do seu pai e o dia dos namorados. O resultado é uma mãe louca, exausta, com um saco bem cheio, prestes a explodir algumas vezes. Sim, filho, às vezes dá vontade reclamar da vida, de questionar a inteligência de Deus que não inventou o revezamento de peito com os outros membros da família do bebê, de surtar com ideias como amas de leite e peitos de roscas que pudessem ser deixados com a vovó de vez em quando. Amamentar pode ser (e muitas vezes vai ser) uma encheção de saco!! Mas uma chateação da qual eu não abriria mão por nada nesse mundo, meu filho! NA-DA!!

Depois do primeiro mês de tensão, as coisas foram se ajeitando no segundo mês e no terceiro, já pegamos o jeito. Como eu disse antes, a posição ideal, a duração, intervalo e frequência das mamadas mudam o tempo todo, mas já não demoramos tanto para nos adaptar. E muitas, muitas vezes, é uma delícia!!! A cada semana tínhamos mais mamadas prazerosas e tranquilas. A partir do quarto mês foi só alegria! É uma delícia ter você em meus braços. E você passa a mãozinha em mim, esfrega os pezinhos no meu braço, uma fofura. Dá um orgulho danado ver que meu corpo é capaz de produzir tudo o que você precisa. É incrível saber que eu sou capaz de amamentar meu filho, que meu leite está fazendo seu corpinho crescer e se desenvolver. Poucas coisas na vida dão mais satisfação do que sua carinha de bêbado, literalmente mamado, quando sai do meu peito. E nem vou dizer aqui os benefícios para a imunidade, desenvolvimento cerebral, dentição e mordida, respiração, etc. Nem vou falar dos benefícios para mim, de emagrecimento à diminuição do risco de câncer de mama. Nem vou falar da economia de dinheiro e da praticidade de não precisar carregar mamadeiras e latas de leites para cima e para baixo, nem ficar limpando e esterilizando todo esse arsenal.

Não sou radical para achar que quem mama mamadeira está fadado a uma vida sem saúde. Também não acho que só porque você está no peito está livre de qualquer risco de usar aparelho ortodôntico, por exemplo. Não é isso. Mas eu tenho a certeza de que estou oferecendo a você o melhor alimento que você poderia ter, filho. É um orgulho, depois de tudo o que a gente passou, conseguir amamentar você em qualquer lugar, só levantando a blusa e colocando o peito para fora. E, com o mesmo gesto, acalentar, acolher e acalmar você. As delícias da amamentação são reais, mas demoram alguns meses para chegar. Estou muito grata com o fato de poder me dedicar a você este ano e, assim, aumentar as chances do aleitamento exclusivo (trabalhando acho que eu não conseguiria). Sei que nossa jornada com a amamentação está só começando, filho. Eu espero que ela seja muito, muito longa ainda, apesar de todas as estatísticas. Sim, às vezes vai ser difícil. Às vezes chato. Às vezes complicado demais. Mas eu tenho certeza de que todas, TO-DAS AS VE-ZES, vão valer a pena. Cada uma delas. 

Nesta semana em que digito a carta para a publicação, filho, você já tem cinco meses e continua firme e forte só com o leitinho da mamãe. Que orgulho! E, realmente, a cada dia que passa vai ficando mais fácil e mais gostoso. Se aos três meses as mamadas “gostosas” aconteciam de vez em quando, hoje elas são regras. Quando digo que é gostoso, quero dizer que já consigo curtir o momento, que é uma delícia ter você aninhado em meus braços, que este, agora, é um momento de aconchego. Não sinto mais qualquer dor ou incômodo. Não preciso mais de protetor de seio pois meu corpo já se adaptou ao seu ritmo. E nos dias em que você dorme a noite toda ainda tiro leite para doar! Eu já me sinto vitoriosa, filho. Fico tão orgulhosa da gente! Orgulhosa por ter persistido, orgulhosa por nós (eu e seu pai) não termos dado ouvido a pitacos que teriam atrapalhado tudo, orgulhosa por ter tido a humildade de pedir ajuda, orgulhosa por você ter tido um pai e uma pediatra que nos apoiaram em toda dificuldade. Demorou, mas finalmente chegamos à parte boa, tão divulgada por aí nas propagandas do governo. Amamentar hoje é simples, fácil e muito, muito gostoso. Tão simples, tão fácil e tão gostoso que, às vezes, eu nem acredito! :) Obrigada, André, por me proporcionar essa experiência de descobrir o que meu corpo é capaz.


Vitória 8 a 10 de sembro de 2015 (três meses e 10/12 dias), 27 de outubro (4 meses e 28 dias), 4 e 5 de novembro (5 meses e 6/7 dias)

Comente pelo Facebook:


0 comentários no blog:

Postar um comentário

 

Cartas para meu filho Copyright © 2014 Design by Amandinha Layouts Amandinha Layouts